A condenação do governo Dilma Rousseff à ação militar israelense em Gaza
gerou forte reação contrária de líderes evangélicos brasileiros,
expondo os crescentes laços entre igrejas protestantes e o governo de
Israel.
A mobilização evangélica teve início em 23 de julho,
quando o governo federal divulgou uma nota condenando os ataques
israelenses em Gaza e convocando o embaixador brasileiro em Tel Aviv
para consultas.
No dia seguinte, cerca de 80 pessoas – em sua maioria evangélicos –
foram ao Ministério de Relações Exteriores protestar contra a decisão.
Uma das organizadoras do ato, a pastora Jane Silva – que preside a
Associação Cristã de Homens e Mulheres de Negócios e a Comunidade
Brasil-Israel – diz que líderes evangélicos de vários Estados e de
diferentes igrejas compareceram à manifestação.
Com o apoio do
deputado federal Lincoln Portela (PR-MG), um dos principais nomes da
bancada evangélica no Congresso, Silva marcou uma audiência no Itamaraty
para expressar a insatisfação do grupo. Eles foram recebidos pelo
embaixador Paulo Cordeiro, subsecretário-geral do órgão para África e
Oriente Médio.
"Ficamos ofendidos e magoados com a postura do
governo brasileiro, que para nós não condiz com a posição da população
cristã brasileira em relação ao conflito", diz a pastora à BBC Brasil.
"Quando o governo fala mal de Israel, fala mal de nosso Jesus. E Israel tem o direito de se defender e de existir."
Ampliar
29.jul.2014
- A adolescente palestina Farah Baker, 16, usa o Twitter para pedir que
os bombardeios contra Gaza cessem. A jovem, que mora em frente ao
Hospital Al-Shifa, na cidade de Gaza, também divulga vídeos e fotos dos
conflitos no local. No cartaz à direita, Baker diz que 'desde que
nasceu, já sobreviveu a três guerras e que acha isso suficiente' Reprodução/Twitter/@Farah_Gazan
O grupo entregou ao embaixador um manifesto em que critica o governo
brasileiro por, entre outros pontos, ter condenado os ataques de Israel
mas não ter censurado as ações do grupo Hamas, que controla Gaza.
"Nós amamos o povo palestino e temos orado pelas mães palestinas, os idosos, crianças, mas não aprovamos o terrorismo."
Após deixar o Itamaraty, o grupo foi recebido na embaixada de Israel.
Também participaram do protesto alguns membros da comunidade judaica de
Brasília.
Presente no ato, a psicóloga judia Kelita Cohen diz
que o apoio dos evangélicos "foi mais uma ação política do que de
devoção religiosa". "As comunidades cristãs partilham com a comunidade
judaica da opinião de que a atitude do governo brasileiro não foi
coerente."
Passagem bíblica
No Amazonas, houve outro
protesto em defesa de Israel organizado por evangélicos – este, liderado
pelo apóstolo René Terra-Nova, fundador do Ministério Internacional da
Restauração. Segundo organizadores, a manifestação reuniu 30 mil
pessoas.
E em seu programa de TV no último sábado, o pastor
Silas Malafaia, principal líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo,
também tratou do tema.
Ampliar
6.ago.2014
- Palestinos em uma carroça passam em frente a prédios destruídos
enquanto retornam para a cidade de Beit Lahiya, fortemente atingida por
ataques e bombardeios aéreos israelenses durante ofensiva no norte da
faixa de Gaza. O país anunciou ontem a retirada de suas forças
terrestres para uma trégua de 72 horas com o grupo armado palestino
Hamas. O conflito - iniciado em 8 de julho após o sequestro e
assassinato de três adolescentes israelenses na região - matou 1.834
palestinos, a maioria civis. Israel registrou 64 soldados e três civis
entre as vítimas Leia mais Suhaib Salem/Reuters
Ao se referir à posição do governo brasileiro quanto aos ataques
israelenses, Malafaia citou uma passagem bíblica segundo a qual "a nação
que amaldiçoa Israel também é amaldiçoada".
Dizendo precisar
"dar algumas dicas (sobre o conflito) para o povo de Deus", ele afirmou
no programa que os atos de Israel são "a reação de um estado soberano
sendo atacado por terroristas".
Na semana passada, a pomposa
inauguração em São Paulo do Templo de Salomão, da Igreja Universal do
Reino de Deus, também deu mostras da crescente aproximação entre grupos
evangélicos brasileiros e Israel.
No caso da Universal, a
aproximação também se dá com o Judaísmo: na cerimônia, bispos da
Universal vestiam quipá e talit, acessórios tradicionais judaicos, e o
hino de Israel foi executado. Do lado de fora do templo, foram hasteadas
as bandeiras da Universal, do Brasil e de Israel.
A BBC Brasil perguntou à Universal qual sua posição em relação às ações israelenses em Gaza, mas não obteve resposta.
'Soft power' religioso
O crescente alinhamento entre líderes evangélicos e Israel não é
fenômeno exclusivo do Brasil. Nos Estados Unidos, país que abriga a
maior população protestante do mundo, os Sionistas Cristãos – como são
conhecidos os evangélicos pró-Israel – exercem importante influência
política.
Para estreitar os laços com o grupo, o governo israelense estimula visitas de grupos evangélicos à Terra Santa.
Ampliar
6.ago.2014
- Palestinos em uma carroça passam em frente a prédios destruídos
enquanto retornam para a cidade de Beit Lahiya, fortemente atingida por
ataques e bombardeios aéreos israelenses durante ofensiva no norte da
faixa de Gaza. O país anunciou ontem a retirada de suas forças
terrestres para uma trégua de 72 horas com o grupo armado palestino
Hamas. O conflito - iniciado em 8 de julho após o sequestro e
assassinato de três adolescentes israelenses na região - matou 1.834
palestinos, a maioria civis. Israel registrou 64 soldados e três civis
entre as vítimas Leia mais Suhaib Salem/Reuters
Em 2013, uma reportagem do Christian Science Monitor, uma das
principais publicações mundiais sobre religiões, descreveu os bastidores
de um evento anual organizado pelo governo israelense para homenagear
líderes protestantes.
No encontro, o prefeito de Jerusalém, Nir
Barkat, disse aos presentes: "Vocês aqui são o melhor ataque e a melhor
defesa que poderíamos ter (…). Aproveitem a cidade de Jerusalém (…) e
voltem para casa como fortes embaixadores do Estado de Israel e da
cidade de Jerusalém".
A reportagem diz que, após se consolidar
nos Estados Unidos, o movimento evangélico pró-Israel agora ganha força
em países emergentes com crescente população protestante, como Brasil e
Nigéria.
Peregrinações em risco
Para a pastora Jane
Silva, caso o Brasil atenda grupos que pedem o rompimento das relações
diplomáticas com Israel, os maiores prejudicados seriam fiéis
brasileiros. "O governo estaria punindo os próprios brasileiros", diz a
pastora.
Segundo ela, muitos brasileiros visitam a Terra Santa
todos os anos. "Só lá podemos ver o túmulo onde Jesus foi sepultado,
onde ressuscitou, caminhar pelas ruas pavimentadas de milagres. Quando
voltamos, logo começamos a programar a próxima visita."
Nenhum comentário:
Postar um comentário